
Fui a um Congresso de Biologia. O primeiro palestrante era um médico, neurocientista. Tiro o chapéu largo: o cidadão era muito eloqüente e carismático. Contou-nos sobre física quântica, teoria do caos, sobre o quanto nós estamos desconectados do meio ambiente, a importância de dormir, os malefícios da maconha e o quanto tudo isso pode interferir no desempenho sexual. Ah sim.. fez-nos aplaudir o stress... pois é importante sim.
Falou também, de maneira impactante, sobre os benefícios do tumor cerebral. Descreveu a cena imaginária:
O médico volta com a chapa em mãos com sorriso largo, ofegante, dá a volta na mesa, senta-se em frente à senhora ansiosa. Ele põe a chapa contra a luz, acende o interruptor e lá está. Leiga, ela não entende, ou finge não entender a imagem de si própria. Preferiu se apegar ao sorriso farto do Dr. e lançou a pergunta:
-Está tudo bem então?
-Se está! Ô! Veja que maravilha e aponta para a chapa da ressonância magnética!
-Sim... Mas me conte... quer dizer que estou bem?
-Pelo o que a senhora vem me dizendo, não está nada bem.Mas Olha aqui que beleza! Lá vem a solução! Do tamanho de um limão galego! Até se parece, o formato, não? Mas estreito nas bordas dos dois extremos.. e redondinho no centro – dizia alegremente o médico desenhando por cima da chapa com uma caneta.
-Mas ... hã? O senhor está dizendo então que eu...
-A senhora o que?
-Que eu tenho um... tumor...? – indagou tremulamente, com dois e pequenos olhos castanhos a vacilarem.
-Mas há! Um tumor não! O tumor! Tá é doido! Esse aqui dá gosto de se ver. Muito bom mesmo. Tá bem na hipófise, crescendo que é uma beleza... – proferia o médico visivelmente orgulhoso de se ver aquela aberração celular no cérebro de sua paciente.
-Mas.. o senh... o senhor... perdeu o juízo? –tentou vociferar como de costume, mas seu quadro era terrívelmente mais importante do que a falta de compostura do médico.
-Calme senhora... ruim estava antes... lembra? Agora vai melhorar. Coisas interessantes acontecem. Confie em mim.
(...)
Depois disso ele descreveu as cenas subsequentes. A senhora entrou
O ponto, em que o médico gostaria de chegar é que este quadro uniu toda a família. As irmãs que não se falavam, os filhos que não se davam, os primos que não se toleravam. Todos sem exceção, ante a iminência do único mal irremediável que acometerá todos nós se uniram, e se revezaram ao pé da cama da tal senhora.
Eis o benefício do tumor cerebral. Essa foi a historinha que ouvi no tal congresso.
Passado alguns meses esta situação acontece em minha casa... Eis que o grande macho alfa... O lendário gorila de pelos já alvos.... o agressor histórico expõe a sua fraqueza: ele também é passível de morte. E o que fez lembra-lo foi um tumor cerebral do tamanho de um limão. Uma beleza. Bem na hipófise! A crescer rapidamente.
E o tal médico do congresso parecia ter profetizado a cena e o desenrolar... Aconteceu tudo dentro do previsto: a família dilacerada se uniu... o gorila mostrou ternura, o casal se abraçou, a irmã voltou, amigos surgiram, todos... ao pé da cama, a se revezarem...
Foi uma alegria e uma ternura dignas de um filme bucólico francês, no qual uma criança nos ensina a importância do abraço.
Mas o tempo passou. A operação foi um sucesso. A família se redilacerou tal uma peça de carne num açougue. O gorlia se ergueu. Ganhou, ganhamos a ilusão, pura ilusão, de que novamente temos tempo (não o temos). Temos tempo para exercitar um pouco mais o que de pior há em nós, para depois nos redimirmos nos acréscimos do segundo tempo.
Não temos esse tempo. Nunca tivemos. Hoje vimos aqui o benefício de um tumor cerebral... A questão é: quantos serão necessários? A receita de panetone direi logo mais, receita de natal feliz eu digo agora: um tumor lá pra novembro, quando ainda está fresco.
Feliz natal!
3 comentários:
=O
esse blog ta ficando muito politizado, e expondo demais suas correntes politicas, nao ??! abçs
RAMO!
MURULA !
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